Sergia A. (Pedro II/PI). Escritora brasileira, mestra em Letras/Literatura. Tem artigos acadêmicos e produções literárias publicadas pelas revistas Desenredos, Revestrés, Letras em Revista (UESPI) e antologias várias. É autora do livro Quatro Contos, Editora Quimera (2018), e responsável pela edição do blog Palavras de.Lirantes. Vive na capital Teresina. [http://palavrasdelirantes.blogspot.com.br/]
O MAPA
O vento corta a pele
entre pinheiros, araucárias, cedros e plátanos
sigo fantasiada de frio
estrangeira em meu país
de vez em quando uma palmeira
uma aroeira um sabiá
e a língua fazendo ponte entre sotaques
outono sem cor
no bosque levanto os olhos em busca de luz
vejo-te sufocado em sombras
com uma lança sobre o peito a sangrar
redesenho o relevo açoitado pelo mesmo vento
sonho cores de areia e mar
desejo trançar teu cabelo como fazem as mães:
é só um pesadelo, vai passar.
UMA VEZ UM ENCONTRO
O teu olhar desloca o meu
entre ilhas como letras miúdas que desenham ondas em tons de azul
entre tipos como palavras que mancham a leveza do papel
entre molduras como o ouro que rabisca formas no museu
desloca-me da noite que me partiu
recompondo em dourado os fragmentos
a fratura exposta ao vazio que o instante corrompeu
balança-me entre cigarras e pirilampos soprando notas de shakuhachi
e lá fora o mundo é novo ainda que velho para mim.
CONFISSÃO EM TARDE DE OUTONO
acato ondas, mansas quando convém
intempestivas quando açoita o vento
firmo o tronco diante delas enraizando-me
entre grãos de areia banhados de espuma.
absorvo acessos em fases revoltas entre calmarias
anima-me o brilho a refletir cores de nuvens e luar
plantado na memória o estado de semente
aguarda o repentino e inevitável movimento
chegará ao que restar de mim, é certo
em murmurantes passos ritmados
o que por destino não me é dado alcançar
e já não caberá às sobras mais que o espanto.
O VOO
Já não sentia sob os pés
a areia
era de nuvens
o longo caminho
Eis que no horizonte
um oceano se estendia
antes do céu
o anteparo
tudo aos poucos revelava
como findável travessia
de formas inúteis
(corpos, posses e certezas)
ou de uma realidade
que no espelho se invertia.